Como ensinar o valor do dinheiro para as crianças
Durante os últimos anos atendi muitas famílias e sempre me deixa bastante comovido a preocupação dos pais em garantir o futuro financeiro dos filhos. É uma preocupação profunda, de quem quer proteger o filhote de todo e qualquer mal que acompanha a escassez de recursos. Esse zelo toma forma. Uns criam uma previdência privada, uns brincam de Banco Imobiliário toda semana, outros matriculam na escolinha de inglês aos 3 anos de idade – a pequeninha não dá conta de tomar banho sozinha, mas já pronuncia o “three” como ninguém.
Os esforços são genuínos, mas vale o cuidado. Não há mal em buscar a melhor faculdade, os melhores restaurantes, as melhores roupas. O grande problema é, de algum modo, transmitir a mensagem de que bem-estar financeiro é preencher todos os espaços com as melhores peças, a todo momento. É maravilhoso oferecer um almoço na melhor cantina da cidade, mas é perigoso deixar implícito que essa é a única maneira de se alimentar. É incrível que frequentem uma excelente escola, mas é péssimo que pensem que essa é a única opção satisfatória. As posturas que adotamos deixam marcas que um livro de educação financeira dificilmente vai dar conta de apagar. Me refiro a duas frentes (distintas, porém conectadas).
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Repertório sociocultural
A primeira diz respeito ao repertório sociocultural apresentado. Não há problema em fazer questão de uma casa com três quartos, para que a criança tenha um só para ela, mas é fundamental que ela saiba que existem, sim, famílias inteiras que vivem em um cômodo só e que não será um grande problema se, em algum momento da vida, ela precisar morar em um apartamento menor. Ela precisa sentir que o propósito de uma casa é servir de abrigo e oferecer algum conforto e que uma lareira não é pré-requisito para viver bem.
Como lidamos com os problemas que envolvem dinheiro na frente das crianças?
A segunda, mais complexa, está relacionada à construção de um alicerce emocional. Posturas que adotamos mediante as diversas situações a que somos expostos, que servirão de exemplo para os que nos tem como espelho. Quão tranquilo e estável você consegue se manter, quando percebe que as contas não fecham? Por quanto tempo você consegue manter o cartão de crédito quieto, dentro da carteira, quando o mês está apertado?
Se desejamos que nossos filhos desenvolvam uma relação saudável e tranquila com o dinheiro, mais do que nos preocuparmos em oferecer o pacote melhor-escola-e-disney-com-15, precisamos nos preocupar em abrir possibilidades, em deixar absurdamente claro que tranquilidade financeira não é uma montanha de dinheiro. Cedo ou tarde essas coisinhas fofas e bochechudas terão que lidar com negativas, terão que fazer concessões e perceberão que sempre tem alguém com mais, sempre há algo para se buscar. É um privilégio que essa realidade por vezes dolorida seja apresentada com amor. Caso contrário, corremos o risco de criar pequenos escravos dos cifrões, insatisfeitos crônicos, que acreditarão, de coração – e muitas vezes com lágrimas nos olhos –, que “é totalmente inviável viver com menos de 10 mil reais por mês em São Paulo”.
Melhor do que almoçar com 100 reais é saber que, se precisar ou quiser, pode almoçar com 10.
*Autor: Eduardo Amuri, consultor para famílias, autônomos e pequenas empresas desde 2011. Além dos projetos relacionados à finanças, cuido também da gestão do lugar. Link original: http://bit.ly/2w75InS. Site: https://www.amuri.com.br/