10 dúvidas sobre licença-paternidade
Promover um maior envolvimento dos pais no cuidado com os filhos. Incentivar o aleitamento materno, aumentando a saúde do bebê. Ajudar a diminuir a diferença entre homens e mulheres no mercado de trabalho, contribuindo para a igualdade de gênero. Todas essas ações, que passaram a ter destaque na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas desde 2015, poderiam dar passos importantes com a ampliação e o fortalecimento de uma conquista: a licença-paternidade.
Ainda hoje, em nenhum país do mundo, homens e mulheres apresentam uma divisão igualitária do trabalho doméstico e de cuidado com as crianças. Em países considerados desenvolvidos, a média de tempo é de oito semanas ou 56 dias. Essas e outras informações sobre a temática fazem parte do relatório A Situação da Paternidade no Mundo, de 2017, produzido pelo instituto Promundo.
Apesar dos 20 dias possíveis, ainda não são todos os pais que fazem uso da licença no Brasil. “O período de cinco dias não é suficiente para que o pai participe minimamente dos tantos cuidados necessários nos primeiros meses da criança. Além disso, a discrepância entre os período da licença-maternidade e a licença-paternidade indica um reforço da responsabilização da mulher pelo cuidado do bebê”, avalia a advogada e professora de Direito do Trabalho, Paula Cozero.
A doutoranda em Direitos Humanos e Democracia na Universidade Federal do Paraná (UFPR) esclarece dez dúvidas sobre a licença-paternidade. Confira!
1- O que significa a licença-paternidade?
A licença-paternidade é o direito do pai de se afastar do trabalho, sem prejuízo no salário, para estar com o filho ou com a filha logo após seu nascimento ou adoção. É um direito também da criança, vez que o cuidado paterno nos primeiros dias de vida (ou nos primeiros dias com a família, no caso de adoção) é muito importante. Além disso, pode ser considerado um direito da família como um todo, por ser fundamental para todo o núcleo familiar que o pai exerça os cuidados com o bebê.
2. Quem tem direito à licença-paternidade
No Brasil, todos os pais empregados com carteira assinada têm o direito de licença-paternidade de cinco dias. Essa licença pode ser estendida para 20 dias nos casos em que a empresa está inscrita no Programa Empresa Cidadã. Quem paga a licença de cinco dias é a empresa e, no caso da extensão para 20 dias, a empresa pode deduzir o valor dos 15 dias a mais no imposto de renda. Para ter direito à extensão o pai deve fazer a solicitação até dois dias úteis após o parto e comprovar que participou de um programa de orientação sobre paternidade responsável.
3. Como funciona o Programa Empresa Cidadã?
O Programa Empresa Cidadã foi instituído pela Lei º 11.770/2008 e permite que as empresas tributadas com base no lucro real deduzam do imposto devido os dias de prorrogação da licença-paternidade (15 dias) e da licença maternidade (60 dias, para além dos 120 a que têm direito todas as empregadas). Assim, elas não têm ônus com a prorrogação. É importante ressaltar que muitas empresas estão submetidas a outras formas de tributação (como o Simples Nacional). Nestes casos não há possibilidade de dedução do valor. O benefício só é válido para as empresas inscritas no Programa Empresa Cidadã, portanto, os empregadores interessados em aderir ao programa podem se inscrever digitalmente por meio do Atendimento Virtual (e-CAC) ou pela página de serviços do governo brasileiro.
4. Como funciona o benefício para funcionários públicos?
Todos os servidores públicos federais têm direito à extensão da licença de cinco dias por mais 15. É necessário apenas que façam o requerimento até dois dias úteis após o parto ou a adoção. No caso de servidores públicos estaduais e municipais as regras podem variar conforme a legislação específica de cada local.
6. Casais homoafetivos também tem direito a licença-paternidade?
Os mesmos direitos garantidos para casais heterossexuais, devem ser concedidos a casais homossexuais, entendimento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal. Assim, os casais homossexuais devem buscar meios para fazer valer seu direito. Infelizmente, tem sido recorrente ser necessário buscar o Judiciário para conseguir efetivar a garantia.
7. Existem outras possibilidade de faltas justificadas no trabalho?
A Lei nº 13.257/2016 (Marco Legal da Primeira Infância), que trata sobre políticas públicas para a primeira infância, garantiu mais duas hipóteses de faltas justificadas para os pais trabalhadores: de até dois dias para acompanhar consultas médicas e exames complementares durante o período de gravidez de sua esposa ou companheira e de um dia por ano para acompanhar filho de até seis anos em consulta médica. São medidas ainda tímidas, sabemos que o número de consultas do pré-natal e a demanda das crianças por acompanhamento médico são bem maiores que o parâmetro que a lei possibilitou de ausências, mas já são conquistas importantes, que merecem ser ressaltadas.
8. Existem propostas no Congresso Nacional para aumentar este período?
Há mais de 30 projetos de lei tramitando sobre o assunto e, inclusive, propostas de emenda constitucional. Os projetos, em regra, apontam para o aumento do período da licença, além de abordar temas como autorização para que a data de início de licença seja a da alta hospitalar em caso de bebês prematuros ou a concessão ao pai adotivo solteiro de licença-paternidade nos mesmos moldes da licença-maternidade.
9. Por que ainda ainda não discutimos o modelo de licença parental?
Alguns países têm adotado modelos de licença que conseguem apontar para uma maior divisão do cuidado com os filhos, especialmente no sentido de conceder licença parental, na qual fica a cargo do casal decidir a forma como será usufruído e dividido o período da licença entre os dois. Na Suécia, tida como referência neste tema, a licença parental hoje é de até 480 dias. Mas é importante ressaltar que o caso sueco é mais exceção do que regra: a maioria dos países adota um sistema que evidencia uma grande desigualdade entre o tempo de afastamento das mulheres e dos homens e, além disso, garante um período bastante curto de licença para os dois – bem menor do que o prazo de mais de um ano sueco.
10. Como conseguir um tempo maior de licença-paternidade?
Uma das alternativas para buscar um tempo maior de convivência com os filhos recém-nascidos ou ainda bebês é unir a concessão de férias com a licença-paternidade, sem que o afastamento seja descontado do período aquisitivo de férias, isto é, os 12 meses trabalhados para garantir o direito ao descanso. Vale lembrar que sempre é possível recorrer ao Judiciário para que casos particulares sejam avaliados: em 2017, por exemplo, um servidor público do Hospital de Clínicas do Paraná, pai de gêmeos, garantiu a prorrogação da licença-paternidade de 20 para 180 dias, a partir de uma liminar do Tribunal Regional Federal. São pontos fora da curva, mas ainda sim decisões interessantes que valem a pena ser destacadas.
Boas práticas
Um ponto importante é o engajamento de pais, mães e cuidadores na cobrança pela aprovação de leis que tratem do assunto e incentivar que um maior número de empresas se cadastrem no Programa Empresa Cidadã. Muitas das iniciativas de aumentar ou até dobrar o período da licença-paternidade, assim como garantir outros benefícios, acabam sendo uma opção da própria empresa de acordo com seus valores e suas políticas. Alguns exemplos são a Natura, que passou a conceder 40 dias de licença-paternidade remunerada, o Twitter, de 20 semanas, e a Netflix, com licença “ilimitada”.
*Autora: Camilla Hoshino, colunista do site Lunetas, O Lunetas é um portal de jornalismo para famílias e interessados na temática da infância. O site é uma iniciativa do Alana, organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que aposta em programas que buscam a garantia de condições para a vivência plena da infância.